quarta-feira, janeiro 23, 2008

Paraguai: um país movido a tererê


Paraguai: um país movido a tererê

Depois de quase 1 ano sem colocar os pés fora do país, lá fui eu, acompanhado dos destemidos Zeca, Nubia e Sibele, rumo às terras de uma nação chamada.... para-ti, para-mim, para-nós, Paraguai!!!!!!!! (ué, conta como mais um país sim senhor, ainda mais quando se visita Assunçao!)

E como faz calor naquela terra! A transpiração é algo que simplesmente ‘faz parte’. Várias vezes você se tapeia, achando que tem um bicho dentro da camiseta, mas não, é apenas mais uma gotinha de suor escorrendo ‘corpitcho’ abaixo. Com uma sensação térmica que chega (fácil) aos 45°C, os paraguaios se apegam ao afamado tererê para suportar a temperatura desértica. Funcionários de lojas, motoristas de ônibus e até os policiais (imagine um brigadiano tomando um chimas enquanto monta guarda na Redenção) levam suas garrafas e suas guampas à tira-colo. Aliás, a diferença entre o chimarrão e o tererê são estas: temperatura da água (que fica na garrafa térmica de uns 3 litros, cheia de gelo) e o recipiente (bebe-se numa guampa vazada, previamente preenchida pela erva-mate).

E o que mais move esta terra? O comércio de produtos importados, para não usar os termos politicamente incorretos ‘muamba’ ou ‘contrabando’. Marcas nacionais fortes? Apenas algumas cervejas e uma tal de Pulp, refrigerante vendido nos sabores laranja (ok), cola (não experimentei) e pomelo (hein?!). Marcas importadas? Não falta nenhuma. Ciudad del Este é quase o Velho Oeste – com o perdão pela rima infame. Sacoleiros e alguns pistoleiros (outra rima, André?) se encontram nas ruas abarrotadas deste verdadeiro ‘cluster’ social da América do Sul, vendendo mercadorias desde as mais luxuosas até as mais duvidosas. Óculos Channel? Todos têm, meu bem. A última máquina fotográfica da Nikon? E só pedir ao vendedor. Mercedez, Toyota, Nissan e Hyundai? Estes povoam as ruas do país, pena que a maioria tenha sido fabricada nos anos 70 e 80 (o Paraguai, assim como Bolívia e Peru, é destino comum de carros usados de países mais ricos, como o Japão).

Falando em Peru e Bolívia, não sei quanto a você, mas na minha cabeça eu encontraria no Paraguai aquele tipo indígena-andino típico (estilo Evo Morales ou Hugo Chavez). Ou então aquele tipo indígena mais brasileiro, afinal o Paraguai é conhecido como a nação guarani, certo? Enganos e enganos. No Paraguai, embora o guarani seja ensinado nas escolas e exerça forte influência no linguajar do ‘idioma paraguaio’, os colonizadores espanhóis - e, depois, brasileiros, uruguaios e argentinos na Guerra do Paraguai - fizeram um ótimo trabalho de extermínio racial. Atualmente, menos de 2% da população é indígena e, nas cidades, apenas alguns raros são vistos vendendo artesanato. Enfim, vê-se um retrato conhecido em toda a América: nações indígenas (Incas, Maias, Astecas, Tupis, Guaranis, Americanos) reduzidas a uma ínfima minoria, isoladas da sociedade. Parece que o destino realmente não reservou um lugar de honra ao povo original das Américas. Enquanto brancos, negros, árabes e asiáticos continuam sendo maioria em suas terras originais, os índios foram completamente destronados, fenômeno apenas semelhante ao que ocorreu com os aborígenes lá do outro lado do mundo. O que restou como herança dos índios foi: comidas a base de milho, cultivo e consumo da erva-mate e um ‘erre’ puxado (aquele bem caipira mesmo, sabe?) que caracteriza o espanhol falado no Paraguai. Pergunto-me inclusive se este ‘erre’ não teria a mesma origem do ‘erre’ caipira do interiorrrrrrrrrl de São Paulo e Paraná, já que estamos falando do mesmo território antes ocupado pelos guaranis.

Indo além da aparência, encontramos o melhor produto que o Paraguai tem a oferecer: o povo. Simpáticos, prestativos, humildes, alegres, dispostos a entender e falar português. Por outro lado, tem-se a impressão de que este mesmo povo carece de uma identidade cultural (que talvez lhe tenha sido foi tirada ao longo da colonização e da Guerra do Paraguai). Ao perguntar sobre música, comida, bebida, artista, região, flor, fruta, luta, enfim, ALGUMA-COISA-PELO-AMOR-DE-DEUS típica do Paraguai, as respostas são invariavelmente imprecisas e levemente encabuladas. A bebida típica é a cerveja (ah, tá, e na Alemanha se bebe água então???), o esporte é o futebol (Ronaldinho???), o hábito típico é beber o tererê (mas e a Argentina e o Uruguai???) e música mais ouvida é Ivete Sangalo (vixe-maria)!

Mais uma vez, o fenômeno em que os países economicamente mais fortes passam a ser também culturalmente dominantes acontece em terras paraguaias. Não se importa apenas produtos, mas também cultura. Assim como não sei se Tostines vende mais porque é fresquinho ou se é fresquinho porque vende mais, não sei se a falta de identidade gera a invasão cultural e comercial ou se a invasão cultural e comercial geram a falta de identidade. Novela, filme, música e estilo, tudo é importado, gerando um processo de retroalimentação difícil de ser freado.
É... o caminho do desenvolvimento não é fácil, mas pelo menos eles não correm risco de apagão (a parte paraguaia da Usina de Itaipu gera energia que dá e sobra). Por outro lado, nós temos Porto Alegre, cidade de temperatura amena e agradável no verão, tão amena que aqui se toma chimarrão em vez de tererê.
Obs: quando eu me aposentar, vou viver no Paraguai. Lá, R$1000 valem 2,5 milhoes de guaranis, você enche a pança por R$8, toma coca-cola por R$0,40 e com U$1,00 você pega taxi para onde quiser!