terça-feira, janeiro 26, 2010

Panamá: mais um país de contrastes

A primeira pergunta pode ser: o que leva alguém ao Panamá? Calma, calma, tudo tem uma explicação.

Desta vez, a viagem foi pela empresa, o que não impediu este bom viajante de investir sua energia turística para conhecer alem do que os compromissos profissionais tinham a oferecer.

Comecemos pelo inusitado. No Panamá, não tem caixa de correio (e nem carteiro, obviamente). Em vez disso, cada cidadão tem uma caixa postal em agências do governo. Então, de vez em quando, você tem que dar um pulo até este tal posto para verificar se recebeu algo. Prático, não :-) ? Ofereçamos um salve à família real portuguesa.

Outro inusitado: o transporte da cidade. Primeiro, os ônibus operam num modelo que mistura táxi, ônibus e caminhão. Explico. O governo vende autorizações para pessoas que querem operar ônibus (assim como se faz com os taxistas no Brasil). Essas pessoas compram a permissão, adquirem um ônibus e passam a atuar na área e na rota combinada (como um ônibus). Problema um: não tem horário marcado. O bus pode passar o dia inteiro como pode resolver não passar naquele dia. Passa a hora que quer e o dia que quer. Problema dois: você realmente acha que é o cidadão comum que compra a permissão e o ônibus? Claro que não. São alguns “empresários” que, em seguida, contratam motoristas (como as lotações no Brasil). E como são remunerados os motoras? Agora vem o melhor... É remuneração variável, ou seja, quanto mais passageiros eles pegarem, mais eles ganham. Resultado: os motoras trabalham o máximo de horas que podem (estilo caminhoneiro) e brigam ferozmente por passageiros. E não acabou. Está imaginando ônibus padronizados, com a rota escrita na frente e tudo mais? Nãnãnão. Cada motora/empresário pode pintar o veículo como quiser (estilo caminhoneiro), colocando frase, apelido para o “diablo rojo” (o termo usado pelos nativos para se referirem aos ônibus), caricatura de celebridades, patrocínios e grafite. É algo tão peculiar que virou atração turística, seguindo a mesma linha do fenômeno das favelas, em que a desgraça ou deficiência social vira ponto turístico. No entanto, para a infelicidade dos amantes do pitoresco, os “diablos rojos” estão com data marcada para desativação: ao longo de 2010, o governo do Panamá implantará um sistema mais organizado (comparativamente, nada muito difícil de ser feito, diga-se de passagem) de transporte público.

Agora vamos aos táxis (ou vc achou que logo os táxis, logo eles, seriam organizados?). Até o ano passado, eles não tinham cor nem sinalização (apenas os mais espertos faziam isso, claro). Não me pergunte como os passageiros os identificavam. Atualmente, eles são amarelos, mas guardam suas idiossincrasias. Primeiro ponto: o taxista pode simplesmente dizer “não te quero”. Se você não oferecer uma rota rentável, ele pode simplesmente se negar a te levar (nada pessoal, claro) e te desejar boa sorte na procura por um companheiro que te queira. Segundo ponto: o táxi pode ser compartilhado. Se você pegou um táxi e, ao longo da sua rota, outro cidadão faz sinal ao taxista, o taxista pode parar e colocar esta outra pessoa no carro com você. Alguns locais dizem que o taxista pode até pedir para você sair do carro, caso o novo passageiro solicite uma corrida mais rentável. Nem preciso dizer que os veículos não têm taxímetro. É na base de uma tabela mental e secreta detida apenas, claro, pelos próprios taxistas.

Descrito o mais inusitado, neste momento, por culpa minha, você deve estar pensando que o país é uma selvageria. Engana-se esfericamente (a não ser quando as pessoas estão tentando entrar no ônibus). É apenas mais uma nação recheada de desigualdades, fato evidenciado pela posição de segundo país com pior distribuição de renda na América Latina (algum palpite sobre quem é o primeiro?). De um lado, cortiços e desorganização. Do outro, a Dubai das Américas. Os caras acabaram de aterrar quilômetros de costa para construir uma via beira-mar enorme, com vias largas, calçadão e arranha-céus. Ok, ok, não são prédios com 100 andares, mas, meu amigo, 50 andares é o padrão. E não é 50 andares no estilo “Voluntários da Pátria”. Os engenheiros e arquitetos estão botando os neurônios da criatividade para funcionar. Tem até prédio – já em construção – em forma de rosca-espiral. Loucura, loucura no caldeirão.

O Panamá também conta com bons serviços de restaurante e comércio. Come-se e compra-se bem e barato, fato influenciado significativamente pelos baixos impostos sobre venda e circulação de mercadorias (em torno de 5% para todas as categorias de produtos e serviços). Outro traço forte é a diversifidade racial. Além da mistura inicial entre os espanhóis colonizadores e os indígenas locais, ao longo do século XX inúmeras outras etnias chegaram ao país, principalmente em virtude da construção do canal do Panamá. Primeiro, foram os franceses, que iniciaram a construção da passagem e que sucumbiram às doenças e às intempéries climáticas da região. Em seguida, vieram os americanos, gregos, italianos, chineses, dominicanos, colombianos e outras pessoas cuja nacionalidade não sei escrever (se alguém souber como se chama o nativo da Martinica e/ou das Antilhas, ilumine minha ignorância).

Dentre tais etnicas, os americanos, claro, deixaram uma marca bastante profunda. Para se ter uma dimensão de sua influência, o dólar é a moeda corrente do Panamá, muito embora a moeda oficial seja o Balboa (nome do primeiro explorador espanhol a cruzar o Panamá e chegar ao lado do Pacífico e sem relação alguma com o Stallone). Os americanos chegaram ao Panamá no início do século XX para o início das obras canaleiras e ali permaneceram legalmente até 1999, controlando não somente as terras do canal como qualquer 5 milhas a leste e a oeste ao longo dele. Os panamenhos simplesmente não tinham o direito de acessar esta faixa de terra, o que foi motivo de vários conflitos, principalmente no final do século passado. Por outro lado, esta presença americana estimulava diversos setores da economia, como construção civil e comércio, que se desenvolveram para atender a um público de maior poder aquisitivo. Os taxistas, por exemplo, ainda ressentem a ocupação ianque, tendo em visto as “tips” generosas que recebiam. Outra herança americana curiosa são os “gringuinhos”, filhos e filhas de militares americanos que ficaram órfãs de pai após a desocupação americana.

E como falar do Panamá sem falar especificamente do canal do Panamá? Hoje, esta via marítima é uma das – se não a – principais fontes de renda do país (aproximadamente 20% do PIB do Panamá). O maior “pedágio” já pago por uma embarcação no canal foi de U$467 mil, efetuado por um navio de cruzeiro, e, em média, os navios pagam de U$200 a U$300 mil por travessia. O movimento no canal é tão grande que o país parece que está prestes a ser invadido. Quem olha da terra para o mar, enxerga uma frota de navios constantemente cercando o país, aguardando sua vez de cruzar o canal. Ah, vale ressaltar que nenhum navio entra na via nas mãos de navegadores que não sejam os próprios práticos (nome dado ao motora do navio) do canal. Estes práticos são diariamente escrutinizados pela empresa administradora do canal a fim de garantir que eles estão no auge de suas faculdades mentais, afinal, nem se pode pensar em um incidente de manobra que venha a prejudicar o funcionamento do canal.

O canal do Panamá tem aproximadamente 80 km de extensão. Ele rasga o estreito país de leste a oeste (certamente o Green Peace não existia na época da construção) e, curiosamente, não foi construído em uma área totalmente plana. Então, para possibilitar que os navios cruzem o canal por um rio desnivelado, existem mini-represas que se enchem e se esvaziam para elevar ou baixar a embarcação. Para tanto, existe também um super-lago artificial, que fornece a água para as mini-represas se encherem e se esvaziarem. Para quem já foi a Itaipu, a grandiosidade do canal lembra um pouco a construção e a estrutura da usina hidrelétrica. É uma obra de utilidade inquestionável (o canal reduz o tempo de viagem de uma embarcação que quer cruzar do Atlântico ao Pacífico de 2,5 semanas para 8 horas), mas (ando meio ecológico ultimamente) que dá medo. Os caras rasgaram o continente. E o que eles fizeram com as rochas e a areia retiradas para a construção da mega-obra? Juntaram a cidade do Panamá a 3 pequenas ilhas, que ficam a 5 km de distância, através de um “mole” para carros. Esteticamente, ficou maravilhoso. É uma estradinha que cortar o mar até estas ilhas, onde existem restaurantes, casas noturnas, lojas e marinas. Mas, não deixa de ser mais uma plástica realizada em um país radicalmente alterado.
Ecologia à parte, sem dúvida foi mais uma bela experiência latino americana. De toda forma, já que o destino da vez se mostrou um pedaço de terra refeito, recortado - e a falta de criatividade bateu forte - vou ficando por aqui, com um parágrafo corta... ao me... Tudo em nom.. da correlaç.. retórica entre text. e assun... :-).
De completo, só um novo salve aos correios brasileiros!
Fotos? Algumas aqui http://www.facebook.com/album.php?aid=140224&id=514369506&l=eade0c6045